O Convite
Espero, espero por ti, e enquanto espero ensaio mais uma vez o discurso. As horas passam, pelas mesas ao lado da minha vão passando todo o tipo de histórias que eu ouço, discretamente, enquanto acumulo chávenas vazias de café em cima da mesa. Se pedires um sumo de laranja será bom sinal. Se pedires um café é porque não pretendes ficar muito tempo. Tu chegas finalmente, com o cabelo apanhado no cimo da cabeça, a camisola inerte em cima da mala, a luz do sol reflectida no teu corpo. Pedes desculpa pelo atraso e eu começo o meu discurso com uma mentira. “Não faz mal, acabei de chegar”. Sentas-te e passas os primeiros minutos à procura de um empregado. Pedes um chá e eu fico sem saber como classificar esse pedido. Bem, se fosse um café seria pior. “Querias falar comigo?”. Sorrio e sinto-me como nos tempos da faculdade em que, nos primeiros minutos em que olhava para o enunciado do exame tinha a certeza absoluta de que as noites passadas a estudar não tinham adiantado de nada. Aos poucos começo a lembrar-me do discurso ensaiado ao espelho na noite anterior e que tenho guardado no bolso das calças. “Professora, posso ir à casa de banho?”. Continuo a sorrir o que não abona nada em favor da minha firmeza. Encostas-te para trás, cruzas os braços, tiras o telemóvel da mala. Agora, és tu que estás à espera. E, ao contrário de mim, não estás a sorrir. “Quero agradecer o teu convite mas… como seguramente entendes, não vou ao teu casamento”, digo e percebo que me estou a desviar do ensaio. “Quero agradecer o teu convite, recusá-lo e fazer-te outro”. Não sorris mas ris-te e dizes-me que não, não entendes, afinal sempre continuamos amigos mesmo depois de termos acabado e que gostavas que eu estivesse presente. Fico em silêncio enquanto revejo mentalmente tudo o que ensaiei. Olho para as tuas mãos, que teimas em abandonar em cima da mesa, e vejo que estão nuas. Não há nenhum anel de noivado e isso devia dar-me forças mas a única coisa que consigo fazer é perguntar-te se já trataste de todos os detalhes. Respondes que mais ou menos, afinal ainda faltam três meses. Olho para ti e tento perceber se essa resposta tem algum segundo significado, mas tu tens os olhos fixos na chávena de chá. “Queres…. mais chá?”, perco a coragem no último instante. Não, obrigada. “Isto não está a correr da maneira que eu planeei”, desabafo. Perguntas-me porquê. “Porque só queria dizer-te que não ia ao teu casamento e perguntar-te se isso te incomodava muito… e se…”. Hesito e nessa pequena hesitação, sei-o agora, perco-te. Levantas-te. “Não, não me incomoda nada. Tenho que ir, falamos mais tarde”, e sais porta fora. “E se querias casar comigo….”, pergunto para o vazio que está sentado à minha frente.
1 comentário:
Absolutamente delicioso! Estou ansiosa para continuar a ler.
Jinhos
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